Amanhã é o dia dos pais. E daí?
Não sei se já falei do pai do João. Talvez não, porque é muito dolorido para mim.
Só que eu não posso mais ignorar este assunto, achando que se eu não falar nada, ele continuará debaixo do tapete…
João tem hoje cinco anos e cinco meses. Ao longo desses 65 meses, eu me desdobrei em papéis que não me pertencem, na infantil tentativa de suprir o roll de personagens necessários para se educar uma criança. Pelo menos na minha imaginação, através dos meus filtros, dentro da minha realidade – assim, bem egocêntrica (pego da palavra o seu significado original e sem deméritos:Â Diz-se daquele que toma a si próprio como referência para tudo).
Marcelo e eu não tínhamos uma relação estável. Ou mesmo uma relação, como descobri depois. Namoramos por três meses. Engravidei sem planejar (eu prefiro o engravidamos, porque foi da forma mais tradicional possível!). No sétimo mês de gestação, nos separarmos de vez. Foi uma época difícil não só para mim, tenho certeza.
Meio perto, meio longe, ele acompanhou a gravidez e, no dia 15 de março de 2006, esteve ao meu lado, aguardando o nascimento do João, com aquela roupa ridícula de centro cirúrgico e cara de pai babão.
Apesar de não estarmos juntos, nunca coloquei obstáculos para a relação pai-e-filho acontecer. Ao contrário – sempre cobrei (até demais) que os dois fossem mais ligados. Desde o início, entendo e aceito que esta é uma relação da qual eu não participo. É algo que eles, os caras, devem construir e fortalecer… ela independe da minha vontade e não está sob meus cuidados. Tudo o que posso e devo fazer é não qualificá-la.
Foi no meio de 2009 que Marcelo se apresentou ao João. A última vez estiveram juntos foi dois anos antes, na festa de um aninho. Um cara estranho aparece na porta de casa e o pequeno corre de braços abertos. Segundo determinação do Juiz, foram quase 16 finais de semana que eles tiveram para se reconhecerem. Em abril de 2010, uma oportunidade de trabalho em Aracaju leva o pai do João para longe…
Vi o pequeno passar maus bocados de saudade. Levei um tempo para perceber que precisaríamos de ajuda profissional. Tatiana, uma psicóloga especializada em relações familiares, me mostrou que andei fazendo tudo errado! Eu inventava desculpas bonitinhas para a ausência do pai, desculpas ingênuas, do tipo: “ele está trabalhando, filho! Tá muito ocupado!”… “viajou!”… “é lógico que seu pai te ama, e deve sofrer muito por estar longe!”, “lá é quase meio do mato! Não tem telefone, nem internet”… Eu achava que assim, justificando esta ausência, eu protegeria meu filho da não-relação.
Hoje, assumo uma nova postura, mais real, mais verdadeira. João precisa aprender a lidar com o pai que tem. Um pai que mora longe, que nunca está presente, que – talvez – reapareça um dia desses para ocupar seu lugar. #Fato. Se bom ou ruim, só mesmo os dois podem dizer.
Como mãe do João, faço um esforço enorme para ficar neutra. E transformar esse material bruto em molde de caráter, de generosidade, de entendimento pelas diferenças. Procuro entender e ensiná-lo que as pessoas agem segundo suas próprias escolhas, e não como nós gostaríamos. Que cada escolha gera uma consequência, de nossa responsabilidade. Que precisamos lidar com a frustração.
Imagem:Â arztsamui / FreeDigitalPhotos.net