11th set2011

O dedo verde

by Biattrix

Quando criança, eu era muito esquisita.

A menina quietinha, obediente, de olhos verdes e pele branquinha, era – de fato! – uma boneca a ser exibida numa redoma de vidro. Eu fui uma criança de apartamento. Em casa, eu vivia de sapato-de-fivelas (boneca!) e meia 3/4!

 

O oposto exato da minha mãe.

Minha mãe cresceu em casa de quintal, sem luxos, sem geladeira ou TV, com o pé no chão. Quando não  brincava de casinha, pulava carniça, jogava bola de gude, soltava pipa e marimbondo! – Isso mesmo: ma-rim-bon-do. Ela laçava o infeliz, lhe arrancava o ferrão e dava linha… até puxá-lo de volta e continuar a brincadeira! – Mamãe adorava comer frutas no pé, coisa que eu nunca entendi! Fruta suja, com coco de passarinho e teia de aranha, eca!

Não lembro de amar a casa da minha avó, como João adora a dele… Agora, tentando lembrar, só penso no medo que eu sentia quando lá estava. É que vovó morava em uma casa-sítio. Eram seis mangueiras, um bambuzal, e mais um monte de outras espécies: lágrimas-de-nossa-senhora (das continhas eu fazia colares e pulseiras!), babosa, espadas-de-São-Jorge, bananeiras, roseiras, goiabeira, fruta-do-conde (amo!) e mato, e terra, e lama, e pedrinhas! Ah! E bichos, muitos bichos! Cachorro, gato, galinha, ganso, marreco, papaguaio, piriquito, coelho… Mais os insetos. Milhares de insetos moravam naquele ecossistema complexo, que todos insistiam em chamar “casa da vó Cutica”.

Sou esquisita, não?!

Eu tinha medo de mosca, abelha, vespa, besouro, marimbondo, mosquito… mariposa e borboleta. Aliás, resumindo: eu tinha medo de tudo o que voava. E de cachorro, de ganso, do marreco e da galinha. Mas, eu adorava os bichos. Todos, sem exceção. Se todos estivessem nos livros. Isso eu sempre amei! Nunca tive medo de livro grosso e pesado. É que desde os quatro anos eu vivo uma vida virtual, conectada com minhas fantasias, histórias em quadrinhos, heróis, outros países e planetas…

Peraí – entenda: eu ia a praia de havaianas. Mergulhava de havaianas. Não tirava as havaianas dos pés.  Eu não curtia a areia entre os dedos dos pés. Pode?!

Curiosa, sempre procurei saber um pouco sobre quase tudo. Adoro estudar e aprender coisas novas – o que, para mim, representa energia em movimento. Até sei sobre mitologia romana, mas não gravo os nomes das plantas. Ô, dó! Se palmeira ou bananeira, árvore é árvore, e tem também arbusto, moitinha e flores. Pronto.

Sempre perguntei a minha mãe como faria com meu filho.
Como ensiná-lo sobre esse mundão de coisas?

Mamãe é do tipo Tistu. Ela tem o dedo verde. Suas plantinhas estão sempre lindas e bem cuidadas. Ela passa horas no jardim, sabe o nome de tudo o que é planta. Se gosta de sol ou prefere a sombra fresca. Se floresce em maio, setembro ou janeiro… Se é época de morango, caqui, caju, abricó ou abacaxi. Sabe até quando é ananais!

E mesmo morando em apartamento, nossa casa sempre tem muitas flores! O carinho que mamãe tem pelas pessoas, ela dá em dobro as plantinhas. E quando uma nova flor se abre, ela toda sorridente e orgulhosa nos chama para ver… Hoje, eu gosto tanto disso, que muitas vezes me pego relembrando suas caras e bocas a contar sobre um novo botão do seu jardim.

Foi minha mãe quem me deu a muda da Árvore da Felicidade que cresce na minha varanda. Ela me levou à Cobal, me ensinou a escolher o vaso, a terra, o adubo. Replantou a muda, me orientou sobre os cuidados…

E com esses gestos simples, de muito carinho, ela me ajudou a transformar meu apartamento em um lar.

5 Responses to “O dedo verde”

  • me lembro como sua mãe mostrou, com tanto carinho, as “plantas” que ganhou de aniversário.
    uma fofa!

    • Biattrix

      Pela primeira vez na vida, ela foi à Paris encantadora, romântica, arrebatadora.
      Sabe a dor de viajar justo em setembro?
      Muitas de suas plantas abririam em flor sem que ela pudesse ver…

  • Bia, eu fui um moleque! Brinquei na terra, subi em árvore… minha casa sempre teve muita planta, aliás até hoje! Minha mãe e minha avó adoram plantas… não sou tão habilidosa quanto elas com as plantinhas mas tento! 😀
    Beijos!

  • Camila

    Eu sou como você, medo de todos esses bichinhos que voam e criada como bonequinha em apartamento! ..rs. Mas aprecio muito quem teve esta criação como a sua mãe teve, que desenvolveu instintos com a natureza. Certamente desenvolveu uma afiniidade maior pelo contato, mas uma questão de uma oportunidade. Também espero poder dar este tipo de oportunidade aos meus filhos algum dia, como você está tentando dar ao João fazendo do seu aparmento, um lar!

    Parabéns!

    Bjs!

    • Biattrix

      Camila! Obrigada!
      Agora, com duas gatas em casa, eu nem preciso me preocupar com os insetos! Elas se divertem com a caça e garantem a nossa alegria.
      Eu queria ser menos fresca, sabe? Porque no fundo acho isso mesmo – que sou uma fresca! Adoro o cheiro e o som das matas, sabe?
      Mas, dou ataques se um monstro voar pra cima de mim!!!
      Beijo!

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